quarta-feira, 9 de novembro de 2011

O diagnóstico do rato: O porquê dos porquês - Parte 1

No post anterior referente a saga do rato de laboratório, que se encontra no link
    
me comprometi a voltar e explicar o porquê dos porquês.
  
A intenção inicial era explicar os três pontos do diagnóstico em apenas um post, mas, para delimitar confortavelmente cada um dos porquês, ainda que os três estão interligados, julguei melhor criar três novos posts, um para cada explicação.
  
Bom, como sou adepto do princípio de que o melhor ponto para iniciar-se uma conversa é justamente, e sempre, pelo início, comecemos, então, pelo começo:
  
Este é o resumo da aplicação do item 1 (conforme o texto do post anterior):
  
1. Ignore tudo que ela falou durante a crise de pânico.
  
"Ao voltar para casa, entre com uma expressão normal no rosto, como se não tivessem discutido ou brigado no dia anterior, e depois de alguns minutos, olhando com uma expressão normal e num tom de voz calmo e indiferente, pergunte alguma coisa banal, do tipo "Aquelas bolachinhas de leite acabaram ou sobraram algumas?". Após ela responder normalmente, esta ou alguma outra pergunta banal, feita depois de algum tempo, continue agindo como se não tivessem brigado em nenhum momento, e, sem encará-la diretamente, demonstre na expressão do rosto que não existem lembranças do que conversaram no dia anterior".
  
Bom, funcionou, maravilha. Mas... porquê funcionou??? Vamos lá...
  
Uma pessoa em estado de pânico não consegue refrear seus medos e nem ao menos entender expressões ou intenções alheias, por melhores que sejam. Não vale, em hipótese alguma, querer argumentar ou fazer uma pessoa em pânico entender alguma coisa. Você pode sorrir para quem está em pânico, abraçar, explicar-lhe suas razões, falar num tom suave e açucarado, dramatizar, oferecer brindes, mostrar slides, cantar parabéns a você, dar uma caixa de bombons e um ursinho de pelúcia, tudo com a melhor intenção do mundo, mas não conseguirá nenhum resultado positivo, pois existe um problema crucial que lhe impedirá de alcançar seu objetivo. Digo isto porque tudo o que uma pessoa normal faz para tentar controlar alguém que está em estado de pânico se resume em: tentar fazê-lo raciocinar, voltar a pensar corretamente, certo? E todo mundo sabe disso, que é necessário redirecionar a forma de pensar do doente mental, e... bom... desculpem-me... estou batendo no óbvio... porque, quem não sabe ??? Qualquer pessoa deste mundo, mesmo com um mínimo de inteligência, sabe que para trazer alguém de volta à realidade basta fazê-lo(a) pensar corretamente, e todo nós temos uma receita para isso, seja uma receita caseira ou acadêmica, que se baseia em técnicas de concentração, de meditação zen, ou força de vontade, ou auto-conhecimento, etc., etc., enfim, tudo que aprendeu-se lendo livros de auto-ajuda, ou qualquer livro, curso, palestra ou conselho que propõem-se a desvendar a psique humana, ou mesmo naquele cursinho de primeiros socorros que foi ministrado aos funcionários da sua empresa, ou, até mesmo, sem base nenhuma, simplesmente aproveitando-se da oportunidade para satisfazer seu próprio ego, realizando um desejo oculto, como diria Freud, reprimido desde a infância (coitado do Freud, ele não tem nada a ver com o que estou escrevendo...) de ser reconhecido como um ser elevado com poderes sobrenaturais que consegue consertar mentes, entortar garfos, desentupir pias e exterminar pragas de piolhos e carrapatos... bom, mas, independente do método, o importante é conseguir, através de argumentações sábias e precisas, fazer o doente pensar com clareza, novamente, Correto? Bom, te peguei... é aqui que mora o problema: PENSAR. O que o doente mental bipolar mais deseja na vida, neste momento, e é o que está mais distante dele, é justamente PENSAR. Ele já visualiza uma seqüência de desgraças diante de si simplesmente porque os impulsos agressivos vem e ele não consegue refreá-los. Ele sabe que está sendo altamente destrutivo, sem medir conseqüências, sem preservar posses, ou bens, ou emprego, ou relacionamentos, e nem a si mesmo.
  
E a cada (falsa) agressão que sofre, sente descargas elétricas e/ou hormonais no seu corpo, que inflam o cérebro numa fração de segundo, como se todo o sangue do corpo quisesse morar no cérebro, e descarrega através de palavras as suas neuroses violentas, e ele está isolado dentro de si, perdido em si, é verdade, mas, escute isso, por favor: ainda que pareça que  expressa seus verdadeiros sentimentos e pansamentos, ele não vê-se como o ser raivoso que pisoteia os incautos que atravessam seu caminho, ele não tem tempo para concordar ou discordar com as palavras que profere (e fere), porque no mesmo tempo em que explode sua violência, está procurando dentro de si os controles, os fios, os comandos que lhe devolvam a autonomia do corpo, e este esforço é tão grande que só consegue minar ainda mais seu estado caótico e elevá-lo a picos de maior descontrole e violência. Mas, veja que interessante, dentro do(a) violento(a) existe uma consciência paralela que conversa alto consigo mesmo(a), dizendo o que, na verdade, gostaria de estar falando ao seu interlocutor: por favor...! Para de falar...! Me ajuda...! Apenas se cale...! Meu Deus...! Eu não consigo parar...! Aonde está o meu freio...
  
Bom, eu falei que, nesta hora não valem argumentações nenhuma, correto? Que não vale tentar fazer o doente mental em pânico raciocinar normalmente, certo? E sabe porque?
  
Agora, uma pausa. Respire um pouco... outra pausa... agora vamos: na verdade, no que se refere a este primeiro item do diagnóstico do rato de laboratório, este é o porquê do porquê do porquê do porquê do porquê do porquê do porquê do porquê do porquê do porquê do porquê do porquê do porquê.
  
Isso já foi falado, discutido, ensinado, doutrinado, apregoado aos quatro cantos da web e do mundo, mas parece-se um detalhe tão insignificante que aparentemente nem merece atenção, porém, esta é a base para qualquer terapia a ser aplicada em pessoas durante crises de depressão profunda e de pânico: depressão e pânico de bipolares são diferentes da depressão e pânico clássicos, se é que podemos chamá-los assim.
  
Bom, como isso já foi tão bem apregoado e mesmo assim tão facilmente esquecido e/ou ignorado, acredito não ter problema nenhum repetir novamente: depressão e pânico de bipolares são diferentes da depressão e pânico clássicos.
  
E qual a diferença entre uma coisa e outra? (calma, calma, não me apresse, eu nem te traria até este ponto se não houvesse a intenção de explanar estas diferenças, não me olhe com este olhar de cobrança por que já estou começando a sentir umas descargas elétricas na cabeça...bom, vamos lá...)
     
O estopim da depressão clássica é:
     
- Sensação de perda, de separação, de solidão, de frustração, uma angústia proveniente de um fato, ou seja, um fato angustiante ocorreu e esta sensação de angustia prolonga-se por um bom tempo. Esta angustia persistente é, por si, o estado de depressão clássica.
     
O estopim da depressão bipolar é:
     
- O paciente bipolar está feliz da vida, normal, rindo bastante, produtivo, cheio de projetos, e de repente, tendo percebido ou não, ocorre uma reação no seu cérebro, uma alteração química, e o cérebro simplesmente para de funcionar normalmente, e, após alguns momentos de confusão mental crescente, e de problemas de coordenação motora, não consegue mais pensar, ou melhor, pensa o que quer, vai solto que é uma maravilha, e o coitado do proprietário do corpo sente-se como aquele cidadão que vai passear no sábado no shopping Center e vai todo bonito, arrumadinho, mas não tem nenhuma moeda no bolso para colocar crédito nas máquinas de diversões eletrônicas, então fica fingindo que tá dirigindo o carrinho de fórmula um, mas o que ocorre na tela é só a demonstração do jogo, do programa, e o carrinho, na verdade, vai para onde quer, independente da bela encenação daquele que gira freneticamente o volante, fingindo que tem o controle do carrinho (mas não tem, absolutamente, controle nenhum...)
     
Antes de continuar: comecei falando de pânico e terminei falando de depressão, não é mesmo? Explico: o meu foco aqui são os bipolares, e raramente a depressão de um bipolar não termina em pânico, em escala maior ou menor. A própria sensação de perda de controle da mente, e, por conseqüência, do corpo, já desencadeia a depressão, e, após alguns momentos, junta-se à depressão o medo de nunca mais voltar ao estado da normalidade, e isto já gera o pânico ou começo do pânico. Resumindo, a simples alteração química do cérebro, sem nenhuma ajuda exterior, tem o poder de iniciar os processos de depressão e pânico, sem que haja um motivo real para isto. Agora, é lógico, se no contexto do momento atual em que vive o doente mental existe um motivo que possa elevar até mesmo uma pessoa com saúde mental plena a um estado de angustia extrema, então, neste caso, a depressão e o pânico do bipolar são elevados ao estado da perfeição, ao estado de arte pura, suprema.
  
Agora, para me redimir (não quero ser injusto), peço perdão a todos, acadêmicos ou não, que utilizam métodos que visam "calibrar" os pensamentos daqueles que estão atravessando estados de depressão ou pânico: a forma como me expressei anteriormente pode ter parecido irônica, sarcástica, mas, na verdade, todas as terapias que trabalham a nível de direcionar pensamento são válidas, com certeza, mas apenas para os que estão sob o estado de depressão ou pânico clássicos, e não bipolares. Para explicar o porquê, tenho que voltar ao porquê do porquê: deprimidos clássicos PENSAM; deprimidos bipolares NÃO PENSAM. Deprimidos clássicos podem mudar o foco de pensamento, se forem ajudados neste sentido. Agora, se você quiser torturar um bipolar durante uma crise, a coisa mais cruel que pode fazer é olhar-lhe dentro dos olhos e dizer: pense.
  
A aplicação prática deste conceito, no caso real citado no post anterior (no link informado no início deste post) deu certo. Inquestionável. E poderia ter dado errado? Hãm?... o quê???... é... peraí... bem... é.... como explico? É... é... PODERIA!!! EU CONFESSO...!!! PODERIA TER DADO ERRADO, SIM!!!!!!... Na verdade, só deu certo porque ela já estava entrando na fase pós-pânico, que chama-se: culpa e vergonha... não daria certo se ela estivesse no ápice da crise de pânico pois neste momento se ele a ignorasse, até isso, ser ignorada, receberia como uma forma de afronta e ataque (eu nunca falei que era fácil conviver com um bipolar...)
  
Ok, ok, mas, estamos num jogo de xadrez... se esta jogada não desse certo, estaríamos, então, em check? Não haveria um plano de fuga? Um plano B? É elementar, meu caro, que haveria, sim, um plano. Ou uma pequena mudança de estratégia. Mudança? Hum... não, não... não há mudança e nem um segundo plano, na verdade isto também já faz parte da estratégia: Caso seu silêncio e/ou aparente indiferença joguem gasolina na fogueira, aborte o primeiro item e vá direto para o segundo item do diagnóstico do rato:
  
2. Trate-a como um doente, dirija-se a ela da mesma maneira que um médico dirige-se a um paciente.
  
Ora, ora, tratar como doente uma pessoa que está totalmente descontrolada sem correr o risco de ofende-la???
  
Polêmico. Complicado, não? Mas tem uma lógica. Profunda. Tem um porquê. E vou explicar o porquê do porquê no próximo post da trajetória do rato que se chamará:
  
O diagnóstico do rato: O porquê dos porquês - Parte 2
Até lá.
  
Fiquem com Deus.
  
   

4 comentários:

  1. Olá...

    Poxa..goStei daqui..vc explicou tudo tãO EXPLICADINHO...

    Acho que sou meio neurótica...sério..
    Qualquer dia vc poderia postar algo a respeito..

    te per sigo ( brincadeirinha ).
    Te sigo..

    Bj

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  2. na verdade, há sempre um porquê como resposta ao porquê(?).

    a razão dos porquês pode parecer estranha, mas ela é a base da aceitação ou da compreensão e aqui dá-se, então, a chave para abrir aquela porta, por vezes ou quase sempre (para alguns), tão complicada de abrir... o Bipolar.

    o Diagnóstico do Rato promete. ele vai lá chegar e estou convencido que vai clarificar muitos cérebros, sejam eles, de Bipolares ou não.

    que venha o post seguinte para se desmistificar o porquê de ser tão simples e tão complicado viver com a doença Bipolar.
    o relatório serve para quem é Bipolar e para quem não o é, mas convive com quem o é.

    saiba porquê, como eu espero vir a saber.

    um Abraço,
    meu Amigo

    Nota: alheio ao porquê, só consigo comentar como Anónimo por isso, fica aqui a minha identidade:
    sérgio figueiredo (http://históriasdeumbipolar.blogspot.com)

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  3. olha, cá estou eu

    depois de lido, e pouco assimilado, confesso, visto que estou num estado de parvoíce (obrigação de acamada por algum tempo), e que me faz parar a pouca actividade que o meu cérebro costuma utilizar.
    o sentimento de solidão, de descontrolo, de impotência, me estão matando, e minha psique está atravessando um estado de paralização imcompreensível.

    desculpe não me referir concretamente ao seu post, apesar de saber, e não sei porque, o que vai na sua alma mesmo sem o ler.

    abraço

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  4. Olá!!

    Passei pra te desejar um bom feriado e uma boa semana!!

    bj

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Comentários estão liberados por tempo indeterminado, pois não terei condições, por algum tempo, de moderá-los (estarei sem internet durante algum tempo então não sei quando exatamente retornarei) por isso comentem a vontade e os comentários serão publicados automaticamente, porém, fica assim, logo que consiga voltar e lê-los, caso haja algo ofensivo ou inadequado, irei deletá-los, ok? (porém, tenho que ser justo: todos que passaram aqui e comentaram ou não, até este momento, só trouxeram alegrias). Ah, sim... ainda em tempo, há um post muito indigesto neste blog, se chama "Será que vale a pena...?", este post é tão horrível que, até este presente momento, só mesmo eu tive coragem de comentá-lo, por isso, para promover aquele texto (poema????) horrendo, os heróis (que Deus lhes proteja) que conseguirem comentá-lo concorrerão a uma caixa vazia do meu remédio faixa-preta, com uma dedicatória e meu autógrafo. Fiquem com Deus, assim que possível, retornarei. Bye.