sábado, 13 de julho de 2013

Paralelos



Tem-se cultuado,
desde sempre,
o estado de loucura.
Não a loucura déspota,
assassina, vegetativa,
mas a criativa,
que traça paralelos
com mundos
paralelos
pelos quais transita-se
voluntariamente (ou não),
(talvez) por falta de
alternativas,
mas... triste descoberta:
neste estado (enfermidade),
a criatividade, na verdade,
é atividade surreal,
sombras, luzes, sons, silêncios,
que vazam, misturam-se
sem controle ou qualidade,
por falhas físicas
ou químicas,
desencadeadas não pela perfeição
mas por falta dela,
e atingem o ápice,
geram desconforto,
e, por mais que seja genial
o impulso da arte,
não é prazeroso
criar, gerar, escrever...
É dolorido...
Nesse momento
vive-se como morto
ou morre-se como vivo,
e, vivendo-se, prolonga-se tanto
a sensação de estar morto
que, parece que, viver, por si,
é uma forma de praticar-se suicídio.
Aqui, a criatividade
não possui a beleza
de uma loucura pré-fabricada
numa viagem psicodélica,
induzida por drogas
naturais ou sintéticas,
possui, mesmo, é a sensação
de desespero, de transitar
a esmo entre
animais de peçonha,
em gargantas gélidas, úmidas
nas fendas profundas, abissais,
onde a escuridão
tem peso e forma,
mas... basta...
não há como expressar-se,
através de palavras,
por isso, busco comunicar-me
com a razão
dos que buscam a razão
através dos sentidos:
a loucura tem o aroma
fétido de esgotos,
de matéria orgânica
morta, decomposta,
imersa em águas
paradas, enfermas,
e, ao paladar,
tem o sabor rançoso,
amargo, intragável,
de águas pútridas
de rios poluídos...

...
..
.
.

.

Vai indo, depois eu te alcanço...


O frio do tempo
presente
congela, acorrenta,
os ponteiros do
relógio
na parede.
Relógios com ponteiros
são retrógrados,
antiquados,
admito.
Porque, então,
não consigo trocá-los
por relógios modernos,
digitais,
do tipo com leds,
hologramas,
cronômetros,
barômetros,
compressores e/ou  
dilatadores
de tempo,
com funções avançadas
de (tele)transporte
para outros mundos,
portais...
mas... não...
não dito as regras...
sou sujeito
passivo,
mero expectador,
personagem do sonho
no sono
semi-acordado,
equilibrando-me
na tênue linha
que separa
o acordar e dormir.
Aqui, o cenógrafo
e diretor
da fita
é o estado (atual):
alegre, fartar-me-ia de cores,
mas, triste e/ou confuso,
vagarei por vielas
gélidas, sombrias...
Não consigo mudar a roteiro!
Como gostaria
de alterar
esta sensação
de tempo parado!
Queria outro cenário!
Outra paisagem!
Mas vejo-me, agora,
num quarto frio, gelado,
com azulejos sujos,
gastos, quebrados,
uma janela opaca
voltada para
o horizonte
desfocado,
o ar é pesado, ocre,
difícil de inalar,
cheiro forte,
de amoníaco, de urina,
de remédios,
de enfermaria,
e eu, não vejo-me,
não sei se
estou sentado, deitado,
ou colado
no chão,
a olhar
o relógio, coitado,
inflando seus pulmões
como se pudesse respirar,
arfando, ofegante,
veias saltando,
quase enfartando,
tentando girar
seus ponteiros,
tentando fazer
o tempo avançar,
mas...
não adianta!
O tempo parou! Congelou!
vou neste compasso
de tempo parado,
e, reconheço, que,
não posso prender-te, leitor,
concedo-te alforria,
liberto-te!
Pode ir,
deixe-me só, aqui,
não importe-se comigo
(isso vai longe...),
vá na frente, e,
quando libertar-me,
correrei um pouquinho,
sigo-te e alcanço-te,
e estaremos alinhados,
quando,
finalmente,
estiver inserido
no mesmo tempo
presente,
de qualquer
pessoa,
que vive
sem mesclar sonhos
com elementos
da realidade,
com meias-verdades
e verdades
absolutas,
verdades
completas
(e vice-e-vice-e-vice-e-versa).

Até mais...


quinta-feira, 16 de maio de 2013

Réquiem para um poema assassinado


Se a palavra
proferida
como verdade
não traduz o âmago,
não há sinceridade
e nem verdade.
(ah, redundância infantil,
aberração verbal,
vai mal,
já no princípio,
a escrita...)
Admito:
por que
utilizar o artigo
de conjunção
aditiva
se ambas palavras
são mais que pares,
são intrínsecas?
Ou, será que,
diremos verdades,
não sendo sinceros,
ou seremos sinceros
proferindo mentiras?
Bom, a bem da verdade
(para comigo mesmo)
pergunto:
porque falaremos sobre isso?
Estou cá, já um pouco
revoltado...
sinto-me lesado,
pois vim por um tema
do qual já nem lembro-me,
meu cérebro... este intruso,
vem como quem
não quer nada,
persuade-me, envolve-me,
oferece-me palavras,
aceito-as,
passo-lhe a vez,
ah..., abusado, comodista,
inocentemente convido-o,
e em seguida, expulsa-me,
vaidoso... exibicionista!
Ama os microfones
e holofotes,
não se toca,
vai-se assim,
sem planejamento,
sem estética,
sem ética,
vem simplesmente e descarrega
todos os devaneios
da sua boca sem freios,
esgota seus assuntos
e extingue os meus!
E, vai longe,
nada estanca,
ou coagula
a vazão
de sua divagação
hemorrágica
verbal,
estender-se-á,
conectará absurdos,
e coisas banais, mas...
basta! tomo atitude,
não aguento mais!
Oportunista, roubou-me a cena!
Matou o meu tema!
Perdi a razão,
e ajo como animal
irracional,
nem eu e nem ele,
está decidido!
A caneta é meu punhal,
assassino o poema!!!
Conheço a lição:
roupa suja lava-se em casa,
por isso, aos leitores,
peço, perdoem-me,
por trazer a público
porfias internas,
mas tu, cérebro,
precisas de mim,
sou teu canal, e tu alter-ego,
fica-te, mudo, então,
intrometido,
pois bato-te a porta na cara!
Falta-me, talvez, polidez,
sou sem educação,
reconheço,
mas não menos que tu,
adeusboanoitepassebem!!!!


quarta-feira, 27 de março de 2013

O doce estigma do anonimato

Assisto,
impassível,
a persistência
dos que alçam a voz,
abrem as portas,
tateiam pelas paredes,
insistem na aproximação,
no contato físico
ou verbal,
tentando tirar
da penumbra
um ser desconhecido,
invisível,
porém real,
que não faz barulho,
esconde o rosto
e o corpo,
mas sabe-se que existe
porquê deixa rastros,
deixa sinais,
e a herança do seu passo
é um grito,
ou um sorriso,
ou um gemido,
que desperta todo o
interesse do mundo
ou a indiferença total.
Mas... que importa?
Não apiedai-vos do homem sem rosto
pois não é algo imposto
ou acidental.
É bom não ter rosto, afirmo,
porque todos os rostos
espelharão-se,
caberão em mim;
e se roubei-lhes a voz,
tomarão para si
minha causa pessoal,
e nessa hora não serei uno:
serei universal.
E de fato é fato
que visto a capa
do mimetismo,
do anonimato...
e gosto de estar sem ser visto
ou ausentar-me sugerindo
a possibilidade de, talvez, nunca ter ido.
Insisto que há, acredite,
um patamar reservado
aos escritores invisíveis,
uma áurea de mistério
que envolve os pseudônimos,
invertendo papéis:
o autor torna-se personagem
no imaginário de seus pares
ocasionais ou fiéis,
e expande-se,
alcança dimensões
inimagináveis,
nem sempre (ou nunca) reais.
Vai-se, assim, mui longe:
serei moldado, transportado,
expandido,
e sopros de pensamentos
impulsionarão minha nave
rumo ao destino,
lugar atemporal
onde o muito nunca é demais
e viverei anonimamente,
morrerei anonimamente,
e saberão tardiamente
porque mortes de indigentes
não estampam os jornais.

good bye

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sábado, 26 de janeiro de 2013

Quem dera...


Quem dera
fosse eu
menos
introspectivo,
que tivesse o dom
de interagir,
de retribuir
tantas visitas,
de dialogar,
ser o bom anfitrião
que abre as portas
da casa,
que recebe com sorriso
e suaves palavras,
mas quase sempre
sou apenas muralha...
intransponível, diria assim:
sou carcereiro de mim,
do tipo que esconde-se
atrás da cortina,
prende a respiração,
não responde
aos chamados,
dos mais insistentes,
interessados,
preocupados,
não atende
o telefone,
ainda que o toque
seja irritante,
tão estridente,
que dói nos ossos
e na alma...
finjo-me ausente,
finjo-me morto,
finjo-me estátua
mas...
Vou organizar-me,
juntar os restos,
descobrir quem sou,
encontrar minha fórmula,
então serei eu,
depois de tanto tempo,
e abrirei a porta,
surgindo sorrindo
com a maior cara lavada,
e dirão:
"Ei... você estava aí...???"
e responderei
"Desculpem-me...,
estava dormindo,
se chamaram-me, não ouvi,
entrem,
esperem-me na sala,
enquanto abro as janelas
e preparo um café
com torradas..."

...
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